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Funcionário mais antigo do clube, José Cardoso comemora 45 anos de Flamengo

Do interior da Paraíba, barqueiro rubro-negro fugiu da seca e chegou à Gávea aos 19 anos

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Quarenta e cinco anos de Flamengo. É esse o aniversário que José Cardoso Santana, funcionário mais antigo do clube, comemora nesta sexta-feira (24). Ele chegou à Gávea em 1975, oitenta anos após a fundação do Mais Querido e o início da vitoriosa trajetória no remo, mesma modalidade que acolheu Cardoso aos 19 anos. Cacá, como é carinhosamente chamado pelos atletas rubro-negros, começou como faxineiro e, hoje, é o barqueiro do clube.


Do interior de Alagoa Grande, cidade entre João Pessoa e Campina Grande, na Paraíba, Cardoso começou a trabalhar com 7 anos. Seu instrumento era uma enxada, que usava para ajudar o pai a plantar feijão, milho, fava e algodão. Este último era vendido para que a família conseguisse aos sábados comprar um quilo de carne seca e um saco de pão para a semana. Num lugar com apenas dois meses de chuvas ao ano, a água era escassa e dividida com os animais.

Com 19 anos, decidiu sair do pequeno vilarejo de apenas 15 casas. Sem documento, pediu ajuda à mãe e os dois foram ao cartório da cidade. A data de nascimento para o registro foi decidida ali, na hora, baseada num palpite: 13 de março de 1955. Com o documento em mãos, Cardoso estava pronto. A viagem até o centro de Alagoa Grande foi em cima de um jumento e durou duas horas, chegando lá, comprou uma passagem de ônibus para o Rio de Janeiro. No caminho, o primeiro vislumbre do mar o assustou em João Pessoa, e os sinais de trânsito causaram estranhamento. Depois de 56 horas sem descer do veículo por medo de ficar para trás, ele chegou à Cidade Maravilhosa.


Após um mês no Rio, na casa de uma irmã em Copacabana, foi atrás de emprego. Pegou um ônibus e desceu no ponto final, na Lagoa, onde deu de cara com a sede náutica do clube. Entrou e esperou. Quando foi abordado por um segurança, disse estar atrás de trabalho e foi apresentado a Guilherme Augusto do Eirado Silva, o Buck, grande treinador do remo rubro-negro.

“Ele perguntou o que eu queria, respondi que seria trabalhar. Aí ele levantou os braços para o ar, em direção ao Cristo Redentor, e gritou ‘Cristo, pela primeira vez alguém quer trabalhar!’”, conta o barqueiro. “Cheguei no clube sem destino, sem perspectiva de nada e sem esperança, após ter deixado o sertão da Paraíba e ter sobrevivido à seca e fome”, completou.

Cardoso começou no mesmo dia. Desde então, são 45 anos sem faltar. Para ele, os funcionários e remadores são como uma família. A relação com os atletas é tratada com carinho.

“Eles são o motivo de toda a engrenagem, são os atores principais. Foram eles os responsáveis pela fundação do clube. Considero como filhos e um pouco mais. Acompanho o primeiro dia de cada um, quando é trazido pelo pai ou pela mãe. Quando sinto falta de um na equipe, faço contato para saber o que houve, aí eles dizem ‘como você sabe que eu faltei?’ e respondo que não foi isso que ensinei. Isso para mim não tem preço”, conta Cacá. “Às vezes, eles saem correndo de uma prova que foram campeões e enfiam a medalha no meu pescoço e dizem ‘essa é sua, você sempre acreditou em mim’”.

Há tanto tempo no clube, o Flamengo virou sua vida. Ele relembra momentos marcantes e fala sobre os aprendizados. Perguntado sobre o que mais gosta no Mais Querido, Cardoso responde de bate-pronto.

“É do que faço. Preciso fazer bem feito e é isso que me satisfaz e me faz importante na equipe. Meus companheiros de trabalho e todo o time também, e quando o Flamengo joga no Maracanã no dia da regata e é campeão de terra e mar”.

Quando a pergunta é sobre o que considera mais importante na vida, Cacá é direto. “O Clube de Regatas do Flamengo. Me acolheu sem nada, e hoje tudo que eu sou e tenho, sou grato a ele”, diz. “Nele, aprendi a me colocar no lugar do outro, na alegria e na dor, aprendi que para você ser grande, não precisa ser rico materialmente, ser grande é você compreender cada um com o pouco que tenha honestamente”.


As equipes de remo e canoagem do Clube de Regatas do Flamengo contam com recursos de seus patrocinadores – Estácio, AmBev e Rede D’or – via Lei de Incentivo Federal/Ministério do Esporte (IR) e Lei de Incentivo Estadual/Secretaria de Estado de Esporte, Lazer e Juventude (Seelje) do Rio de Janeiro, além de apoio do Comitê Brasileiro de Clubes (CBC) proveniente da descentralização de recursos oriundos da Lei Pelé.