Exportar o espetáculo
MARCIO BRAGA
Em uma análise superficial, o futebol brasileiro na Copa do Mundo se limitaria à seleção. Entretanto, são os clubes de futebol que promovem a formação permanente dos jogadores que representam o país na competição internacional e, por isto, a seleção é apenas a ponta desse grande iceberg. A realização da Copa de 2014, especialmente, exigirá do Brasil ainda mais do que somente um time competitivo. Será necessário concentrar esforços para uma série de intervenções legislativas, regulamentares, econômicas e estruturais, não só, mas particularmente, nos estádios.
O Brasil terá então uma rede de equipamentos esportivos modernos e de altíssima qualidade, que não podem se tornar elefantes brancos. Os clubes de futebol são responsáveis pela utilização constante desses estádios e, por isto, é preciso discutir agora uma estratégia para que a Copa sirva de catalisador para o desenvolvimento do futebol brasileiro, em especial a reestruturação societária, econômica e financeira dos clubes, além do adensamento da cadeia produtiva do futebol, que já responde por 3% do PIB brasileiro.
O momento nunca foi tão propício a mudanças estruturais na forma de organização e administração do futebol brasileiro. O presidente Lula tem sido, com a sensibilidade ímpar de um torcedor apaixonado, grande incentivador. O Legislativo, por sua vez, discute atualmente um projeto que altera a Lei Pelé e tem por objetivos proteger o atleta em formação e o clube formador; regulamentar de forma clara e objetiva a relação trabalhista entre os clubes e seus jogadores; e destinar recursos das loterias para os clubes formadores de atletas olímpicos.
Ao mesmo tempo, o Clube dos 13 criou um grupo de trabalho para estudar medidas capazes de melhorar a saúde financeira dos clubes, tendo como referência o sistema de licenciamento implementado pela Uefa e cujo exemplo já foi referendado pela Fifa, que recentemente solicitou às associações que fizessem algo semelhante. Os trabalhos serão coordenados por outro torcedor apaixonado e um dos mais brilhantes economistas do país, o professor Luiz Gonzaga Belluzzo, presidente do Palmeiras, que contará com a colaboração de representantes de Corinthians, São Paulo, Grêmio, Vasco e Flamengo.
Além disso, motivados pelo apelo do presidente Lula, a entidade nacional de administração do futebol (CBF) e os demais setores da sociedade envolvidos com o tema deram início a um debate sobre as alterações necessárias para aperfeiçoar o calendário das competições brasileiras, com o objetivo de aproveitar plenamente seu potencial de mercado e à luz do atual calendário internacional, o que, além de valorizar nossas competições, poderá permitir aos clubes brasileiros explorar outras fontes de geração de receitas no exterior. O Flamengo, por exemplo, deverá poder jogar com o Real Madrid, em vez de ser obrigado a jogar com o Real Potosí a 4.000 metros de altitude, como ocorre atualmente.
Não é a primeira vez que o Executivo e o Legislativo tratam de medidas para reestruturar o setor, mas é a primeira vez que Estado e sociedade fazem um movimento conjunto para refletir sobre alterações estruturais. Temos que exportar nosso espetáculo, e não nossos jogadores. Devemos, portanto, aproveitar este momento para discutir e implementar programas de apoio ao desenvolvimento da cadeia produtiva do futebol, por meio da viabilização de investimentos públicos e privados que contribuam para o seu adensamento e a modernização da prestação de serviços ao torcedor, gerando mais emprego, mais renda e mais alegria.
\ MARCIO BRAGA é presidente do Flamengo \