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Discurso do Des. Sylvio Capanema

REUNIÃO SOLENE DE ANIVERSÁRIO CONSELHO DELIBERATIVO DO CLUBE DE REGATAS DO FLAMENGO, REALIZADA EM 27.11.2008 ORADOR: DES.Sylvio Capanema

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A data: 17 de novembro de 1895. O local: o corredor de uma velha casa de habitação coletiva, situada na Praia do Flamengo n°22. Os personagens: Nestor de Barros, Mario Spindola, José Agostinho Pereira da Cunha, Napoleão de Oliveira, Lucci Cólas, José Maria Leitão da Cunha, Carlos Sardinha, Eduardo Sardinha, Desidério Guimarães, Felisberto Laport, George Leusinger, Maurício Rodrigues Pereira, Egydio Pereira, José Felix da Cunha Menezes, e Domingos de Azevedo Marques, que chegara por acaso, sem sequer suspeitar o que ali ocorreria. O evento: a fundação de um clube de remo, a que denominaram de Clube de Regatas do Flamengo.

Os que, por acaso, tivessem assistido a reunião, numa esplendorosa manhã carioca de domingo, teriam a certeza de se tratar de mera e inconseqüente aventura de um pequeno grupo de jovens atletas, e que duraria o tempo fugaz de um sonho de verão.

Depois de eleger a primeira Diretoria e empossar o Presidente, justamente o guarda-marinha Domingos de Azevedo Marques, a primeira deliberação da Assembléia, e por unanimidade, foi retroagir, para efeito de comemorações oficiais, a data da fundação do clube para 15 de novembro, feriado nacional, em homenagem à Proclamação da República.

Nada mais premonitório e sábio.O aniversário do Flamengo teria que recair em dia de festa, de exaltação cívica, um feriado que se perpetuaria no futuro, já que, na opinião dos fundadores, a República, proclamada seis anos antes, “viera para ficar”.

No aniversário do Flamengo, qualquer que fosse o dia da semana em que recaísse, poderi-se-ia celebrar, em comovida confraternização, a perpetuação do sonho tornado realidade.,,,,,,

A partir de então, o 15 de novembro não mais se identificaria, na memória social, apenas com o nascimento da República, mas também, e principalmente, com a criação de uma outra nação, que ficará para sempre, a nação rubro-negra, da qual somos fieis e dedicados súditos e a qual nos entregamos com a paixão vulcânica dos que se dão por inteiro, com a devoção dos que têm fé, com o orgulho dos que percebem a grandeza de seus sentimentos.

As reuniões iniciais da Diretoria, eleita por aclamação, pelo pequeno grupo de aparentes visionários, foram realizadas em um banco do Largo do Machado, à luz mortiça dos lampiões de gás, quase sempre já pela madrugada. Os livros de ata e de presença eram preenchidos sobre os joelhos do Secretário, Nestor de Barros.

Nem o mais romântico dos otimistas, ou um jogador inveterado, apostaria na sobrevivência do novo clube.

Só depois se percebeu que algo mágico acontecera, um destes momentos, que não se sabe bem porque, constroem a eternidade, que rompem a cronologia monótona do tempo, que fundem passado e futuro. Uma centelha de energia que faz e que escreve a história das nações.

Mais tarde, já consolidado o clube de regatas, abriram-se às portas ao futebol, com a liderança de Alberto Borgeth, que rompera com a diretoria do Fluminense, abandonando-o com quase todos os demais jogadores, asilando-se no Flamengo.

Espraiou-se pelo país a mística rubro- negra. Como uma epidemia ás avessas, a epidemia do bem, a contaminação incontrolável do orgulho de ser Flamengo, tendo como sintoma a sensação deliciosa de ter sempre a quem amar , visceralmente.

Hoje tenho a certeza absoluta que o Flamengo nasceu para quebrar a rotina dos fatos comuns da vida.

Ser Flamengo, por exemplo, não é uma simples questão de opção diante de alguma circunstância posterior que nos atinja, como acontece com os que escolhem os outros clubes

Ser flamengo é um determinismo biológico, um mistério que a lógica do racional não conseguiu até hoje explicar. Nós nascemos rubro-negros,crescemos rubro-negros, morremos rubro-negros.

Ser Flamengo é como a própria personalidade, que se inicia no nascimento com vida, e é o atributo natural do ser humano, a lhe garantir a preservação da dignidade.

Não precisamos explicar a ninguém a razão de nos tornarmos rubro-negros. Até porque nem nós a conhecemos.

O Flamengo não se ofereceu a nós. Nos é que nos oferecemos à ele. O Flamengo não nos dá, materialmente, nada. Nos é que lhe damos tudo. O Flamengo não nos cobra a vida. Nós é que lhe doamos o corpo e a alma,

O Flamengo nos faz orgulhosos, mas não soberbos, generosos e compreensivos com os demais que não tiveram a sorte ou o bom senso de escolhê-lo para amar.

Por ele nos sentimos heróis de batalhas que ainda nem sequer travamos, peregrinos de caminhos ainda não trilhados, e nos descobrimos gente, e não apenas torcedores.

Hoje não comemoramos só mais um aniversário de fundação. Os seus 113 anos: a idade do flamengo não se mede cronologicamente e sem pelas suas glórias.

A cada 15 de novembro celebramos a própria vida, a razão de ser dos nossos mais sinceros e eternos sentimentos, agradecendo a felicidade de termos nascido rubro-negros, e reafirmando o compromisso de servi-lo, cada vez mais dedicada e apaixonadamente.

O Flamengo converte em lúcido o que pareceria incoerente. Quem de nós já não jurou nunca mais assistir a um jogo seu, após uma derrota que nos tenha parecido humilhante. E lá estamos, no domingo seguinte, ainda com maior entusiasmo, torcendo como embriagados de amor, e se nos cobram o cumprimento da promessa, nós a atribuímos a um lapso de absoluta insanidade, felizmente já curado.

O Flamengo democratiza, porque não reconhece classes, e muito menos raças; o Flamengo sai às ruas, não se fecha em sedes, sobe os morros, cruza fronteiras vence as distâncias físicas, a todos aproxima.

Os rubro-negros se tornam irmãos, não pelo sangue, e sim pelo sentimento, pela paixão.

O Flamengo é sonho que se sonha a cada dia nas arquibancadas e palácios. E som, que ouve à qualquer distancia, é chamado que se atende sempre.

O Flamengo é nossa família, nossa terra prometida, o estuário de nossos sonhos mais acalentados, o rio por onde flui a nossa vida.

O Flamengo é o remanso e a corredeira; a realidade e a utopia, o ontem e o amanhã, porque ele é tudo.

Tenho a plena consciência de não me ter sido possível definir o Flamengo.

Ele é como o tempo e a saudade, que também não se definem.

O tempo simplesmente passa, a saudade apenas dói, mas o Flamengo, sente-se!

Tentei passar para o papel o que nós todos aqui irmanados, sob a proteção do “manto sagrado”, estamos a sentir, em comovida união Procurei ser o interprete de uma paixão, a porta voz de uma nação.

Enquanto houver o tempo, enquanto houver dignidade humana, enquanto houver amor, existirá sempre o Flamengo.

E É POR ISTO QUE “UMA VEZ FLAMENGO, FLAMENGO ATÉ MORRER!!!!!!”.